quarta-feira, 29 de dezembro de 2010
...E AQUELES QUE POR OBRAS VALOROSAS…
Num balanço do ano de 2010 em Condeixa, não podem deixar de ser referidas as Comemorações do Centenário da Implantação da República, iniciadas no dia 5 de Fevereiro e continuadas ao longo de nove meses, sempre no dia cinco de cada mês, até à data chave, 5 de Outubro de 2010, 1º Centenário do dia em que Portugal abandonou o sistema retrógrado da monarquia, absolutista ou liberal, mas sempre uma forma de imposição de alguém que, por nascimento, considerava ter autoridade sobre os seus semelhantes.
Omito as oito primeiras sessões porque, razões de ordem vária, me impediram de estar presente.
Assim, apenas vou dissertar sobre a sessão que finalizou o ciclo, também com o intuito de homenagear os condeixenses que arriscaram o sossego, a posição social e o bem-estar familiar, para lutar por um sonho, por uma forma política que terminasse de uma vez com as discriminações sociais.
Infelizmente, sabemos hoje, nada disso foi conseguido. Mas, no dia 5 de Outubro de 1910, esses valorosos lutadores da liberdade, estavam convencidos que, finalmente, a luta chegara ao fim.
Falar da República, em Condeixa, é evocar o nome ilustre do Dr. Juiz António Pires da Rocha. Aliás, o apelido desta família é sinónimo de prestígio na vila. Desde Fortunato Rocha da Fonseca que em 1877 comprou a Farmácia Gama (actual Farmácia Rocha, o mais antigo estabelecimento condeixense, sempre do mesmo ramo), a seus filhos, Dr. António Pires da Rocha, juiz; Comandante Fortunato Pires da Rocha, oficial superior da Marinha de Guerra e Dr. Júlio Pires da Rocha, farmacêutico e criador de vários medicamentos. Sem esquecer um dos mais jovens membros da família, Manuel Rocha, Director do Conservatório de Música de Coimbra e violinista de craveira, neto do Dr. Juiz.
Com a intenção de homenagear gente da minha terra que …”por obras valorosas se vão para além da morte libertando!”, faço a biografia do Dr. Juiz Rocha, utilizando para isso as informações que, no dia 5 de Outubro de 2010 seu filho, Fortunato Batista Pires da Rocha, leu perante a Assembleia reunida no Salão Nobre da Câmara Municipal de Condeixa:
“ António Pires da Rocha nasceu em Condeixa no dia 9 de Dezembro de 1884 e aqui faleceu em 31 de Julho de 1954. Era filho de Fortunato Rocha da Fonseca, farmacêutico, e de Teresa Jesuina Pires do Rio.
Frequentou a Escola Primária de Condeixa, sendo seu professor Francisco Maria Simões de Carvalho. Em Outubro de 1896, foi estudar para o Liceu Nacional Central de Coimbra. Com o colega e amigo Carneiro Franco, mais tarde deputado da República, ainda meninos, fizeram-se políticos, entrando para um grupo de livres-pensadores. Em 1904 matriculou-se em Direito, na Universidade de Coimbra, num período de grande agitação política. Em 1905, inscreveu-se no Partido Republicano Português. Foi co-fundador do Centro Académico de Coimbra e do Centro Republicano de Santa Clara. Fundou e foi professor, gratuitamente, durante três anos, de um curso nocturno no Centro Republicano de Santa Clara, ensinando a ler inúmeros operários de Santa Clara e da cidade. A sua acção política e conspirativa atingiu o máximo durante a greve Académica de 1904, da qual foi um dos intransigentes, e nos anos que se seguiram, até à implantação da República.
Em 6 de Outubro de 1910 esteve presente, assinando a Acta da Proclamação da República em Coimbra, feita pelo Dr. Fernandes Costa, o qual, de seguida, foi ocupar o lugar de Governador Civil.
Em Condeixa, (o Dr. Juiz Rocha) foi Administrador do Concelho desde 7 de Outubro de 1910, a 17 de Março de 1913,data em que pediu a exoneração, por se ter constituído o 1º Governo partidário, chefiado pelo Dr. Afonso Costa. Em 7 de Dezembro de 1913, foi eleito Presidente da Câmara de Condeixa, renunciando aos vencimentos, a favor da autarquia. A 26 de Junho de 1914, pediu a demissão por optar pela carreira da magistratura. (nomeado Delegado do Procurador da República, em Miranda do Douro).
Durante o período em que foi Administrador do Concelho, houve várias tentativas monárquicas para derrubar a República. Nunca prendeu nenhum adversário político, embora fosse instigado a isso. A D. Joana Lemos era acusada de aliciar conspiradores para as hostes de Paiva Couceiro (líder monárquico) e veio um oficial a Condeixa para a prender. Foi aconselhado a ouvi-la em auto, mas que a deixasse em liberdade, o que fez. Assumiu a responsabilidade da manutenção da ordem e de facto nunca houve a mínima alteração. Opôs-se a todas as violências e protegeu a religião e os padres, por entender que a liberdade era para todos. Promoveu a reparação do telhado da Igreja, acabando com a especulação, principalmente da D. Joana Lemos e da D. Marquitas Bicho, que diziam que a República queria acabar com a religião e vender o edifício da Igreja. Assistia às sessões da Câmara e orientava os vereadores no sentido de criarem escolas e fazerem melhoramentos públicos. Acabou com a mendicidade dos “passageiros”, dando-lhes de comer do “rancho” dos presos e pagando as rações do seu bolso.”
Das memórias do Dr. Juiz Rocha, constam vários episódios do período inicial da República. Como esse texto é longo, vou procurar resumi-lo, relatando apenas alguns extractos mais relevantes, ocorridos após a exoneração, a seu pedido, do cargo de Administrador do Concelho. Para o seu lugar, foi nomeado o Dr. José Luís de Almeida que “… se encostou ao Francisco de Lemos e aos seus partidários monárquicos e moveram guerra sem quartel aos antigos correligionários que se haviam passado para a República”.
E continua o Dr. Juiz Pires Rocha:
“Em Condeixa só eu era livre-pensador mas, por isso mesmo, não hesitei em colocar-me ao lado dos padres de Condeixa-a-Velha e Zambujal, os únicos que não pertenciam à facção do Francisco de Lemos (casa Lemos Ramalho) …O padre do Zambujal era Joaquim Augusto da Silva, pessoa tímida e inofensiva. Pois para o assustarem, uns meliantes amigos do Lemos atiraram numa noite uma bomba de morteiro contra a sua janela. Os mesmos indivíduos noutra noite entraram na Igreja, arrombaram a caixa das esmolas e urinaram no pavimento. O padre Silva ficou muito desgostoso com estes actos de vandalismo e eu aconselhei-o a queixar-se à autoridade policial a qual por fim pronunciou alguns deles, sendo condenados, mas ficaram pouco tempo na cadeia porque beneficiaram de uma amnistia. Também se deu um caso bastante grave com o toque do sino às almas. Desde tempos imemoriais, o toque correspondia ao recolher. As pessoas retiravam-se para as suas casas e ali rezavam o Pai-Nosso e a Ave-maria, pelas almas dos seus parentes. Não havia alarde de religiosidade, mas a recordação saudosa dos seus mortos queridos. O toque das almas consistia em certo número de badaladas um pouco espaçadas, que não incomodavam ninguém, até serviam para lembrar a toda a gente que eram horas de deitar. Em Condeixa tocava-se às almas todas as noites, mas no Zambujal era só na Quaresma. O Administrador do Concelho resolveu proibir o toque no Zambujal, por acinte contra o padre Silva, mas permitindo-o nas outras freguesias… O padre Silva escreveu-me a pedir para o aconselhar e eu, depois de me certificar que não havia na Lei sanção contra o toque, a não ser a desobediência à ordem do Administrador, instiguei o padre a que mandasse tocar o sino. A ordem do Administrador não era de acatar, visto que ele não fez afixar editais a proibir o toque dos sinos…O pior é que o Administrador pediu ao Governador Civil para mandar a polícia e depois uma força do Regimento de Infantaria 23, para manter a proibição…porém, à hora de tocar o sino não apareceu a polícia nem as tropas e eu mandei tocar o sino, para satisfação de todo o Povo. No dia seguinte chegou a polícia e depois a tropa. Então, mandei telegramas para o Presidente do Conselho de Ministros, Dr. Bernardino Machado a protestar contra a proibição e responsabilizando-o pelo sangue que fosse derramado em virtude do abuso da autoridade…em breve o Administrador recebeu ordem para autorizar o toque dos sinos. O Povo queria e por isso era justo respeitar a vontade do Povo…A República estava na infância e os chefes, em vez de se entenderem e de continuarem unidos até ela crescer e se consolidar, deram largas às suas incompatibilidades pessoais, às suas vaidades e ambições de mando.”
Era assim o Dr. Juiz António Pires da Rocha. Homem justo, democrata leal às suas convicções políticas e, fundamentalmente, sempre de coração aberto, pronto a intervir onde a justiça e o bem-estar do povo exigisse a sua presença. É com Homens deste gabarito, que se constrói a História de um País!
quinta-feira, 23 de dezembro de 2010
LUGARES DE CONDEIXA-O OUTEIRO(2ª parte)
À chegada ao Largo de S. Geraldo, o Outeiro divide-se. Para a esquerda, o Canto e o Alto. Em frente, a longa subida, à direita, o caminho para a Fonte e a Cascalheira.
A fonte tem pouca beleza, para quem não considerar belo ver brotar da parede um jorro de água fresquíssima, infelizmente impura. Por cima, uma ponte a ligar as propriedades que foram do Comandante Rocha e hoje pertencem à sua sobrinha, Dr.ª Jesuina Rocha Helena. Lá no fundo, o tanque de lavar roupa, agora quase sem préstimo, desde que as pessoas aderiram às novas tecnologias (vulgo, máquinas de lavar). Antigamente, em dias determinados, juntava-se um rancho de mulheres para lavar a roupa, própria ou de fregueses. Trabalho árduo que forçava a estar várias horas a esfregar e ensaboar, batendo depois os panos nas pedras do lavadouro, até ficarem limpos. Depois, era só estender a corar. (recordam-se do filme Aldeia da Roupa Branca?). Servia também para as lavadeiras desenferrujarem a língua, dissecando a vida de cada um. Ali, falava-se de tudo. E cantava-se! De repente, bastava uma começar, para se generalizar a cantoria. Verdadeiro coro espontâneo brotava das gargantas afinadas das lavadeiras. Condeixa, terra de muita água, benza-a Deus, tinha vários lavadouros públicos: a referida fonte, o rio da palmeira na Rua Manuel Ramalho, comprido espaço onde se juntava um grande rancho de lavadeiras, o ribeiro da Serrada e o lavadouro da Lapa. Na primeira metade do século vinte, foi levada à cena no Cine-Avenida, uma revista musical (Secas e Picadas) que obteve enorme êxito local, onde havia um interessante quadro alusivo às Lavadeiras de Condeixa.
Depois da Fonte e descendo as breves escadas, encontravam-se as terras do Paraíso (rua Cidade de Breten, Ciclo, etc.), onde costumavam acampar circos e barracas de tiro. Também cheguei a ver lá teatro, em tenda montada por uma companhia itinerante, com a representação do drama “A Rosa do Adro”, de Manuel Maria Rodrigues. Periodicamente, deslocava-se a Condeixa a companhia Circo Amery, da qual fazia parte a Trupe To Ching (estará bem escrito o nome?), grupo de chineses, -acrobatas ou manipuladores de varinhas com pratos, não recordo bem- constituído por pai, mãe e filhos. Estes, creio serem actualmente os donos do Circo Chen. A família ficava invariavelmente instalada em casa do Zé Galhardo (José Moita), que na altura morava no antigo prédio da casa do Povo. De volta ao Largo, ao domingo de manhã podia assistir-se a uma sessão de corte de cabelo ou barba, a céu aberto, se o tempo permitia, mas ameaçando chuva, dentro do curral da mula. Para isso bastava uma vulgar cadeira, tesoura, navalha de barba, pincel e um recipiente onde misturar com água o sabão em pó que se vendia em caixas de cartão, coloridas. Depois, a paciência e coragem para resistir às mãos do “Ti Picaroto”, (Francisco Caridade), mais habituadas aos trabalhos rurais. De qualquer forma, a pedra- úme (alúmen), estancava o sangue dos golpes mais que prováveis.
Antes de subir as escadas da Costa, uma breve visita à oficina de bicicletas do João da Costa, só conhecido por Nicolau porque era incondicional admirador do antigo campeão das Voltas a Portugal. Homem muito poupado, chegava ao extremo de levar ao rubro no rebolo de afiar, um raio de bicicleta, para acender o cigarro. A pedra de esmeril tinha a meio um fundo vinco motivado pelo atrito do aço que quase a tornava imprestável para outras tarefas.”Vai-te lucro, que me dás perca”.
Em tempos remotos, o caminho desde a Fonte até ao Hospício, fazia-se pela estreita vereda da Costa. Ainda cheguei a conhecer alguém (terá sido o Florêncio Azevedo Branquinho?), que dizia ouvir a mãe contar que se assustava com os tiros de dinamite utilizados para abertura da que é hoje a R. Dr. Simão da Cunha. Não teria sido, portanto, tão remotamente.
Mesmo ao cimo das escadas, morava o “Ti Chico Cavaca” (Francisco da Costa), pai do Chico e do Daniel “Carrula” (Francisco e Daniel Ramalho da Costa). Este último, meu condiscípulo na primária, habilidoso jogador de futebol, no tempo do Campo dos Silvais, morreu com apenas vinte anos, vitimado por um tumor cerebral.
Ao lado, era a casa de Joaquim Melâneo, funcionário judicial e inspirado pintor de arte, característica que seu filho Frederico herdou. Tinha um hábito curioso: de muito bom ouvido musical -comum a todos os genuínos condeixenses- quando regressava a casa, ia assobiando por entre dentes, uma qualquer melodia. Mas só entrava, após a ter concluído. Manias!
Na Costa, moravam também os Salicús! O patriarca, António Melâneo, era pedreiro. Tinha dois filhos, que foram meus condiscípulos, o Vergílio e o António.
No meu tempo, quando saíamos da escola, não nos arriscávamos a descer o Outeiro, porque os moradores da Costa, especialmente os atrás referidos, corriam à pedrada quem invadisse o seu território. Por isso, íamos beber água ao telheiro do armazém de Alcobaça, Peça & Companhia, onde havia uma bomba que aspirava a água do poço. Desta forma, evitava-se a temível descida à fonte do Outeiro!
Três monumentos caracterizam o Outeiro: A Escola Conde de Ferreira; o Hospital Dona Ana Laboreiro d’ Eça e o Palácio dos Condes de Podentes (Hospício).
O primeiro, a Escola, masculina para a distinguir da outra, a Escola Feminina. Meninas e rapazes, no entender retrógrado dos mandantes da época, não podiam coabitar. A escola delas era outro mundo, que nós só visitávamos quando lá íamos obrigatoriamente fazer os exames da 3ª e da 4ª classe.
O edifício foi construído graças à participação de um mecenas. Joaquim Ferreira dos Santos, Conde de Ferreira, era um antigo emigrante em África e no Brasil, onde angariou imensa fortuna. Tendo testemunhado as dificuldades passadas pelos seus patrícios em terra estranha, bons trabalhadores mas analfabetos, incapazes de enviar meia-duzia de letras à família que em Portugal aguardava ansiosamente notícias, quando regressou ao seu país legou em testamento um fundo para a construção de 120 Escolas Primárias. Em todas elas foi inserida a data 24 de Março de 1866, dia da sua morte. Encontra-se sepultado no Cemitério de Agramonte, num mausoléu construído pelo escultor Soares dos Reis.
Em 10 de Setembro de 1867, realizou-se o lançamento da primeira pedra para a construção. Em termos monetários, contabilizava-se 1200$000 (mil reis) da Fundação Conde de Ferreira; 800$000 (mil reis) doados pela Confraria do Santíssimo Sacramento e o restante, da responsabilidade da Câmara Municipal.
(Dados históricos destinados a facilitar a quem pretenda conhecer melhor Condeixa, a inclusão nestes exercícios de memória têm apenas o valor da informação que se pode obter em trabalhos literários, nomeadamente “Condeixa-a-Nova, de Augusto dos Santos Conceição” e “Subsídios Para a História de Condeixa-de Fernando de Sá Viana Rebelo e Isac Pinto.)
A Escola, no meu tempo era dirigida por dois professores: João Correia e António Mateus. Em 1946 faleceu João Correia e foi substituído por António de Jesus Pita.
O que é que se pode mais dizer sobre a Escola? Os anos da infância, são, incontestavelmente, os melhores da vida de uma pessoa. Os problemas resumem-se a conseguir cumprir as determinações dos pais, professores e outros agentes de formação. Mas no meu tempo, as preocupações eram substancialmente acrescidas com o medo de desagradar aos mestres. Porque os castigos eram pesados. Por exemplo: no ditado, cada erro correspondia a uma reguada. Esta, já não era a falada “menina dos cinco olhos”, mas apenas uma vulgar tábua que doía que se fartava, ao bater com toda a força na palma das mãos! Os cachopos de vez em quando inventavam meios de minorar a dor, coisas que, diga-se de passagem, não surtiam qualquer efeito. Lembro-me de uma hipótese que consistia em colocar na mão uma crina de cavalo, crendo a criança que isto provocava a quebra da régua. O pior era se o professor descobria o inocente e ineficaz estratagema, pois redobrava a pena a aplicar.
Como qualquer outra criança, também sofri bastantes castigos. A maior parte merecidos, alguns escusados. Apenas um ficou mais gravado na memória, porque foi inteiramente injusto!
Ao sábado de manhã, havia uma sessão de treino paramilitar, da Mocidade Portuguesa, ministrada pelo Tenente Pires Beato. Imagine-se: garotos dos sete aos dez ou pouco mais anos, aprumados em formatura e a marchar! Que ridículo!
No tempo do professor João Correia, havia uma outra actividade bem mais interessante: um coro formado por todas as crianças da Escola. Aliás, creio ter sido essa a mais valiosa prestação do “temido” professor João Galo.
Em frente, o Hospital!
Foi construído graças à generosidade do condeixense Dr. Simão da Cunha D’ Eça Azevedo, que legou toda a sua fortuna à Câmara de Condeixa, para…”Fundar em edifício próprio, e que satisfaça todas as condições exigidas pela ciência actual, um Hospital para nele serem tratados doentes dos dois sexos, preferindo sempre os da minha freguesia e concelho e custear todas as despesas que para tal sejam exigidas.” (Subsídios Para a História de Condeixa). Era assim que estava determinado no testamento daquele benfeitor.
O Dr. Simão da Cunha faleceu em 1919, mas só em 1921 estava tudo preparado para dar início às suas disposições testamentárias. Só que entretanto a desvalorização da moeda, comprometia a efectivação da obra. Mas, como diz o médico Dr. Evaristo Cerveira de Moura na sua obra ”Nascimento, vida e morte do Hospital D. Ana Laboreiro D’ Eça”, -“então, surge o inesperado. Em 13 de Outubro de 1925, morre em Lisboa, Artur Barreto, senhor de grande fortuna e institui seu principal herdeiro o Hospital. Todos os seus bens nas comarcas de Condeixa e Ansião…mais de cem mil escudos…entraram na Câmara Municipal, em Agosto de 1926. Este facto permitiria vida mais desafogada à obra…assim, em 1926, estava concluído o edifício. Resolveu a Câmara que o pessoal da enfermagem pertencesse a alguma Ordem Católica, sendo contactada a Ordem Franciscana de Hospitaleiras Portuguesas, que em Março aceitou o convite.”
Diz ainda o Dr. Evaristo Cerveira de Moura: “O Hospital teve sempre grandes beneméritos. Não se pode esquecer essa grande Senhora que foi a Ex.ª Sr.ª D. Maria Elsa Franco Sotto Mayor, que chamou a si todo o encargo de comprar e mandar instalar todo o material da sala de operações e esterilização, bem como o valioso arsenal de material cirúrgico para qualquer tipo de operações.”
Em 1976 foi firmado um acordo com a Secretaria de Estado da Saúde, com vista à utilização do Hospital, como instalações do Centro de Saúde. Modificou-se nessa data a forma inicial de funcionamento da velha unidade hospitalar. Mais tarde, com a construção do novo Centro de Saúde, acabou de vez o Hospital D. Ana Laboreiro D’ Eça!
Hoje, ali está um prédio devoluto, lentamente a degradar-se. Até quando?
Seguindo o percurso do Outeiro, um pouco acima do Hospital, era a loja do “Manel Capado” (Manuel Torres), onde comprei muitos caramelos que tinham a embrulhá-los, as figurinhas dos futebolistas para colocar em cadernetas próprias. Este “Manel Capado” era um homem extrovertido que divertia e se divertia. Em todos os carnavais, lá estava sempre a sua figura, dando corpo a alguma figura cómica da altura. Várias vezes o vi participar nas brincadeiras carnavalescas, cortejos ou representação espontânea de paródias de Entrudo.
Logo acima, o prédio da oficina de Benjamim Ramos, com o seu nome em grandes letras de cortiça na fachada circular e a informação que se realizavam serviços de bate-chapa: pintura; construção de carroçarias, etc.
Benjamim Ramos, o “Fechaduras” era um empreendedor empresário que, além da oficina, também instalou uma fábrica de serração de madeiras e dirigiu o lagar “do Fiscal”, na Avenida. Tinha um automóvel Citroen, modelo “arrastadeira” (ainda pertence à família). Um dia foi passear com amigos e, na passagem de nível da Corujeira (Coimbra), por pouco não foi abalroado pelo comboio, que lhe levou o pára-choques do carro. Devido ao feitio do referido acessório do veículo, dizia ele com graça: “O raio do comboio, apenas me levou o bigode!” Mas, se dessa vez escapou à morte, não sobreviveu alguns anos depois, na sua própria oficina, quando foi esmagado contra a parede por uma camioneta.
A terminar o Outeiro, inicia-se a Quinta do Hospício, com uma pequena mata a dar maior realce ao Palácio dos Condes de Podentes.
Antigo convento de frades Antoninos-Franciscanos, funcionou como hospital para doentes mentais, daí a designação ainda hoje existente e que dá nome a toda aquela zona do Outeiro. Com a extinção das ordens religiosas, o convento foi adquirido ao Estado pela quantia de 1251$000, em 1842, pelo 1º Conde de Podentes, D. Jerónimo de Almeida e Vasconcelos.
A construção é de estilo vagamente barroco, possui valioso espólio de azulejaria, vestuário antigo, louças, vários outros objectos de arte e mobiliário. Uma das filhas do Conde de Podentes, foi casada com Carlos Relvas, abastado lavrador ribatejano, considerado o 1º fotógrafo amador do país.
Um dos últimos herdeiros da Casa Conde de Podentes, foi D. Margarida Relvas Albuquerque que era casada com o médico Dr. Henrique Costa Alemão Teixeira.
E está terminada a curta mas aliciante viagem pela memória de um bairro que faz parte do meu imaginário, quer infantil ou juvenil. Desde o tempo escolar, até ao final da adolescência, vivi intensamente o quotidiano “outeirino”. Foi no prédio da cadeia, no 1º andar, que me apresentei como vim ao mundo, perante a junta militar que decidiu apurar-me para todo o serviço militar, a mim, com uns escassos 160 centímetros de altura e meia centena de quilos em ossos, carne e alguns músculos!
Também foi numa casa do Largo de S. Geraldo que nasceu o meu filho mais novo. Na mesma casa onde a minha mãe fechou pela última vez os olhos. Em frente, instalou o meu pai a primeira oficina de reparações eléctricas em automóveis e construção de baterias para os mesmos, que existiu em Condeixa.
É evidente que o Outeiro não é, ou era, apenas o que descrevo. Nenhum local se resume a referências e recordações, por mais elaboradas que sejam. Resta-me a esperança que a leitura destes escritos estimule a memória de quem viveu nesse tempo e se disponha a contar aos mais novos a forma como vivíamos!
FIM
sexta-feira, 17 de dezembro de 2010
LUGARES DE CONDEIXA-O OUTEIRO(1ª parte)
Dos altos e dos recantos
Dos jardins e das Escolas
Passa cantando e sorrindo,
Nos lábios e no encanto
Na graça das “espanholas”.
- Marcha do Outeiro, letra de Ramiro de Oliveira e música de António de Oliveira, composta para abrilhantar as Festas de Condeixa, em 1950, quando elas se realizavam em Junho e não a 24 de Julho, uma data inventada há relativamente pouco tempo.
O Outeiro é assim, e muito mais. Embora se possa pensar que o bairro está limitado à Rua Dr. Simão da Cunha, ele começa ainda na Feira das Galinhas (Jardim da Câmara), espraia-se no Largo de S. Geraldo, mira agora, desconsolado, o nicho vazio, sobe ao Alto, desce até à Fonte e visita o Paraíso, trepa as escadas até à Costa e dirige-se ao Hospício, deixando para trás o Hospital que já não é, nem sequer Centro de Saúde (o que era a unidade hospitalar, senão um centro onde toda a gente tratava a saúde?), e a velha Escola Conde de Ferreira, onde o professor Galo (João Correia) mandava os alunos com aproveitamento dar reguadas nos colegas menos estudiosos, o professor Mateus mordia os lábios quando castigava com a fina cana-da-índia e o professor Pita, rigoroso nos antigos (e cruéis) métodos pedagógicos, distribuía lambadas a torto e a direito.
Ao cimo, no bico da Quinta, ainda está a fonte que há muito secou e onde, segundo escritos antigos, as moçoilas namoriscavam enquanto a cantarinha enchia (não era essa uma das funções, quiçá a mais agradável, de todas as fontes?)
O Outeiro está na génese de Condeixa, a nova, porque a outra é muito mais idosa, avó talvez.
Quando Conímbriga foi assolada pelas hordas bárbaras e, posteriormente, ocupada pelos muçulmanos do Almançor, os pobres indígenas foram sobrevivendo refugiados nas grutas e buracos locais. Depois, vieram as tropas de Fernando Magno e do seu valido, D. Sesnando, Conde de Tentugal, ocupar o território. Desse tempo, reza um documento guardado no Mosteiro do Lorvão, indicando uma “Villa Cova Condesa Donna Onega”que, presumo, estaria localizada numa área actualmente ocupada pelas Piscinas Municipais, Pavilhão Desportivo, quartel da G.N.R. e mais casario, tendo a nascente o promontório do Hospício e a norte as velhas casas da Costa.
Estas terras, muito produtivas, teriam resultado da sedimentação de primitiva lagoa, como é possível vislumbrar no estrato geológico do corte efectuado quando da abertura da via IC3. (curva da ferradura, ao pé do viaduto). As várias camadas, separadas por sedimentação mais escura (lodo) e pedras de leito, são perfeitamente visíveis. Já debaixo do viaduto, o areal da margem.
O nome “Donna Onega” pressupõe ascendência galega, (há uma neta de Vímara Peres, o responsável pela reconquista do território entre Douro Minho e fundador de Guimarães, com o nome Onega Lucides. Será a mesma?) De notar que no local existem várias referências curiosas: “Pinhal de Espanha” (em frente à Junta de freguesia de Condeixa-a-Velha); “Vala da Galega” e, mais concretamente ao Outeiro, cuja designação de Espanha sempre lhe foi atribuída.
No início do século XVI, quando o rei D. Manuel efectuou a peregrinação a Compostela, passou por aqui. Acerca dessa passagem, diz o Padre António Carvalho da Costa: “…o lugar de Condeixa-a-Nova, não sendo mais que um casal chamado Outeiro…” (Santos Conceição, Condeixa-a-Nova). Tudo provas da ancestralidade do Outeiro
Mas estas considerações, só superficialmente e apenas como curiosidade têm lugar nesta crónica. Na realidade, interessa-me mais escrever sobre o bairro de há mais de meio século, com descrição de locais, pessoas e episódios, levando os meus contemporâneos a recordar e os mais novos a conhecer, aquele característico local.
O Outeiro, repito, começa no largo da Câmara, a antiga Feira das Galinhas. A propósito, não consigo compreender a causa da atribuição deste nome. Tanto quanto recordo, realizava-se ali uma das quatro feiras que compunham o tradicional mercado de Condeixa (os três outros locais eram: Praça da República; Feira da Sardinha, (mercado municipal na Avenida, onde se vendia peixe e carne, no local do actual Quartel dos Bombeiros) e Largo de S. Geraldo), mas onde agora é o jardim da Câmara, não se vendiam exclusivamente galináceos. Mais, a maior percentagem de coisas à venda, era de barro vermelho: cantarinhas, caçoilas, etc.
Em meados do século XX, além dos bissemanais mercados, no pequeno terreiro costumavam exibir-se trupes de saltimbancos, acrobatas itinerantes que realizavam espectáculos, fazendo no fim o peditório ao público presente.
Já na estrada, na parte de baixo do monumento aos Mortos da Grande Guerra, há uma loja de ferragens que foi, em tempos, a residência e oficina de José Maria Ventura, latoeiro e aferidor municipal. Dotado de capacidades artísticas verdadeiramente admiráveis, foi durante muitos anos amador de teatro, participando em várias peças e revistas musicais. A sua presença em palco e a graça inexcedível, transformavam qualquer vulgar comédia, em êxito. Na década de 1950, o Clube de Condeixa apresentou em cena a alta-comédia “O Conde Barão”, de Ernesto Rodrigues, Félix Bermudes e João Bastos, encenada por João Pimentel das Neves. Depois da exibição em Condeixa, o grupo deslocou-se à Marinha Grande, onde representou no Teatro Stefano. Desse espectáculo, disseram na altura que José Ventura era comparável ao grande actor profissional, Chaby Pinheiro, protagonista na apresentação nacional da peça, no Teatro Politeama, em 1918.
Tendo muita consideração pela capacidade teatral e, fundamentalmente, pela personalidade de José Ventura, em 1980, quando era encenador na Casa do Povo, propus em Assembleia Geral a atribuição do nome “Tejove”, para o grupo cénico. Correspondia a “Teatro José Ventura”, a homenagem devida a quem tanto fez pelo teatro amador em Condeixa. A proposta foi aceite e lançada em acta. José Ventura tinha um filho, com o mesmo nome, artista plástico amador de fina sensibilidade, ao qual se devem algumas telas de belas imagens da Condeixa antiga.
Na casa seguinte, esteve instalada a Casa do Povo, desde a fundação, em Julho de 1940, por iniciativa do Comandante Fortunato Pires da Rocha, até à inauguração, em Fevereiro de 1956, das instalações actuais. O 1º andar tinha um salão onde se jogava pingue-pongue e damas ou dominó. Numa vila demasiado provinciana, sem locais de ocupação dos tempos livres (tempos livres? Algumas horas à noite, poucas, porque no dia seguinte era dia de trabalho!), a Casa do Povo oferecia o espaço público possível para entretenimento da juventude. Além dos jogos porém, a oferta literária resumia-se à leitura da revista Flama e do jornal Amigo do Povo, publicações afectas ao estado novo.
Na frontaria, foram mandadas pintar a vermelho, (perdão, encarnado, porque a palavra vermelho era tabu, não fosse a designação da cor motivar confusões com os “abomináveis comunistas!), as palavras Casa do Povo, em semi-círculo. O pintor incumbido do trabalho, da parte da manhã apenas pintou Casa do P, deixando para depois de almoço o resto do trabalho. Condeixa, tradicionalmente sempre disposta a atribuir alcunhas, imediatamente apelidou, não só o pintor, como toda a família, de “os Pês”.
Virada a curva ascendente, logo surgia a oficina de bicicletas do Augusto Braga. Naquele tempo, a bicicleta era um veículo bastante utilizado. Em Condeixa, quase se podia contar pelos dedos das mãos o número de automóveis existentes e, mesmo assim, incluindo as camionetas de carga! Por isso, andar de bicicleta, ao contrário de agora, não era simplesmente um meio de fazer exercício físico, mas forma de “tratar da vida”. Nesse contexto, uma oficina onde se pudesse mandar reparar correntes partidas, furos nas câmaras ou raios deslocados, assumia grande importância. Além das reparações, também era possível alugar os velocípedes.
Os garotos de então, ao contrário de agora, que os papás, ainda as crianças são pequeninas, logo tratam de comprar bicicletas com rodas suplementares, trocando estas à medida do crescimento do fedelho, se queriam dar uma voltinha, reuniam-se em grupos e alugavam o veículo. Se não estou demasiado esquecido, esse aluguer custava dez tostões à hora. Mas não se contentavam com o limite de tempo por “tão alto preço”. Então, a hora durava mais que os normais sessenta minutos. É claro que a entrega já não era feita pelo alugador! Entregava-se a bicicleta a um garoto mais novo, com a incumbência de a ir levar. O pior é que esse miúdo também fazia uso do “prémio” colocado nas suas mãos. Finalmente, quando o dono da oficina recebia o velocípede, já tinham passado para aí algumas duas horas.
Ao lado da oficina, morava a senhora Assunção, parteira que, a par da senhora Cecília, de Condeixinha, tinha a “obrigação” de aparar todas as crianças do seu bairro, e não só. Porém, um facto curioso sucedia com esta “aparadeira”: tinha um negócio de venda de caixões. Assim, recebia para a vida um novo ser, mas também se encarregava de prestar os serviços para a última viagem.
Junto à sua casa, uma alfaiataria, coisa bastante comum numa vila onde abundavam os barbeiros, sapateiros e alfaiates.
Naquele tempo, a miséria não se manifestava apenas na falta de alimentos. O dinheiro era tão escasso, que também não chegava para comprar roupas. O alfaiate que refiro, quando jovem, era bem-apessoado, quer dizer, tinha bonita figura. Naturalmente, era vaidoso e se, para a roupa, como profissional podia dar um jeito, não sabia fazer as peúgas. Dizia-se que, certa vez descobriram que usava apenas os canos das meias, porque o resto já se tinha gasto há bastante tempo.
Em frente, no largo agora justamente atribuído ao artista plástico condeixense, Manuel Filipe, existia um barracão onde o proprietário, negociante de galinhas, guardava os apetrechos do seu mister. Possuía uma velha carrinha, a “cacharra”, onde transportava as grades com os galináceos que ia vender nas feiras da zona. Quando regressava, esquecia-se que a altura das grades ultrapassava a cimeira do portão. O barulho dos aparatos a cair, anunciava a sua chegada.
Ao lado, o edifício da cadeia. Pertenceu a D. Maria de Vilhena, que o doou ao Convento de S. Marcos. Mais tarde foi adquirido pelo município, tendo sido a primeira sede própria da Câmara. No rés-do-chão/cave, foi instalada a cadeia municipal. O calabouço, de janelas grossas em ferro, tinha apenas duas ou três celas. Em fins da década de 1960, os prisioneiros serraram facilmente as grades e evadiram-se. Este prédio fechava a curva da estrada de acesso à Lousã e a Tomar. No local, naturalmente bastante perigoso, o acidente mais grave deu-se quando uma camioneta desgovernada colidiu com dois prédios, destruindo-lhes as fachadas, mas felizmente sem danos pessoais. Este prédio foi demolido, com o fim de alargar a curva, a única justificação para destruir tão valioso património.
A partir daqui é que começa verdadeiramente o bairro do Outeiro.
(fim da 1ª parte)
domingo, 5 de dezembro de 2010
Ecologia e caça-as contradições
Um velho democrata de Condeixa,costumava acabar as suas prédicas,dizendo:"Certo ou errado,camarada?"
Mas não ficam por aqui as observações ao tal programa.Calculem que após esta defesa pela ecologia,veio uma reportagem sobre caça.E assisti,enojado,a uma espera ao javali.Esta espécie cinegética(?),esteve quase extinta no país,Depois,as associações de caça,legalmente,penso,fizeram programas de repovoamento.Hoje,o javali é uma constante ameaça para quem ainda da terra tira o sustento.E tudo para quê? Apenas com a mera intenção de satisfazer os instintos selvagens de pessoas que,em lugares pre-determinados,esperam os animais,abatendo-os a tiro.Quero acreditar que nenhuma criança assistiu ao mencionado programa.Porque,como disse,fiquei enojado ao ver a forma selvagem como os senhores caçadores permitiam que os javalis fossem abocanhados e destroçados pelos cães.E,se eles assim faziam,era porque os animais ainda davam luta!
Li algures que esta semana,o Parlamento espanhol, recusou uma proposta de um partido,para transmissão de touradas pela televisão.A Espanha!O país tradicional das lides taurinas!
E cá? Quando acabam os espectáculos deprimentes de sacrifício dos animais?
CONDEIXA-paisagem,memória e história
O volume literário,tem prefácio do Bispo de Coimbra,D.Albino Mamede Cleto e foi gratuitamente composto e editado pela Gráfica de Coimbra,Lda.
Espera a organização colocar este livro à venda ainda antes do próximo Natal ou,na impossibilidade,logo no princípio do novo ano.
O público,certamente irá aceitar com entusiasmo a edição,não só pelo fim a que se destina,como ainda pela carência de literatura referente à vila.
Mais não interessa dizer,para despertar a curiosidade nos possíveis compradores da obra em causa.
quinta-feira, 25 de novembro de 2010
Praça Nova-Praça Velha
quinta-feira, 22 de julho de 2010
Exercício sobre a má-lingua
Dizer mal dos amigos, do país, do clube futebolístico adversário, dizer até mal da família e de si próprio, quando não há mais ninguém à mão, é um exercício que os portugueses praticam com o maior prazer.Os portugueses, comigo incluido, claro,porque honestidade não é só respeitar os bens alheios. Saber admitir os defeitos,por muito que custe ao ego, faz parte de uma prática que deve ser escrupulosamente seguida.
Cá por mim, dou o..e oito tostões por um bom momento de má-lingua. Não é crítica, não senhor, é mesmo "fofoca",como dizem os brasucas.Crítica é outra coisa. Há quem goste de dizer:"crítica construtiva e crítica destrutiva". Nada disso!Não misturar as coisas.A crítica é sempre construtiva!Se eu disser bem de determinada coisa, estou a fazer crítica construtiva, mas se disser mal, já é destrutiva?Bolas para quem pensa assim!Erros toda a gente faz e chamar a atenção para eles, é um acto construtivo.
Por exemplo,as obras que estão a decorrer no centro da vila, são passíveis de contestação.É um direito que assiste a toda a gente.Se são oportunas em tempo de crise,se a Praça bem podia dispensar este desvirtuar radical da sua estrutura,são opiniões válidas, é uma crítica á decisão da autarquia.Tudo bem!Mas se eu disser que o responsável é megalómano,gosta muito de obras de fachada,a decisão vem na sequência de outra Praça que não tem qualquer serventia,já é ser má-lingua!E má-lingua viperina, que ainda é mais!Já para não falar de outra coisa..!Que diabo, o senhor até tem feito obras meritórias,como montes de cimento e tijolo por tudo quanto é sítio.Está bem,toda essa gente só cá vem dormir.Também, não se pode ter tudo!
E dizer que o comércio central vai acabar,porque sem movimento automóvel no perímetro da Praça,as pessoas não frequentam lojas,é maledicência.Andem a pé,que faz muito bem à saúde!Ponham os olhos naqules grupos de pessoas que,depois de jantar percorrem quase em passo de corrida as ruas,a fim de recuperar uma forma física já difícil(ou impossível)de alcançar.A propósito,ainda um destes dias ouvi na TV um "expert"dizer que andar muito após as refeições,faz mal.Mas eles lá sabem!Não é que o passeio sirva para ir pondo a conversa em dia.À velocidade a que se deslocam,até as palavras se perdem.Além do fôlego,claro!
Já agora,mais uma maldadezinha.As escolas dispersas pelo concelho foram reunidas em blocos educacionais,um perto do campo da bola e o outro ao lado da GNR.Até aqui,tudo certo.Mas vamos lá a ver,nos tempos que correm,com tanta malandragem à solta,os encarregados de educação dos alunos optam por ir buscar a suas crianças,de carro,evidentemente.E param onde?Junto ao campo,só se for em cima do passeio.O pior são as multinhas passadas por agentes solícitos.E na Fernando Namora,resolveram pintar faixas amarelas junto aos passeios,que é como quem diz,quem for buscar os miúdos,estaciona a milhas de distância.
Agora também fiquei com um raio de um dilema:isto é crítica,ou má-lingua?Não há dúvida,é má-lingua.Então eles não sabem o que fazem?Por isso é que o povo os escolheu!Ou não foi?Sei lá,isso agora não importa.Antes que me perca em filosofias baratas,deixem-me praticar mais um pouco de acupunctura,quer dizer,espetar mais algumas agulhinhas(não doem,pois não?).Agora que o trânsito se faz com muita dificuldade dentro do burgo,é que damos valor à circular.Isto é,daríamos, se ela não fosse cair no labirinto do mercado às terças e sextas e numa vereda com trânsito nos dois sentidos,quando nem um comporta.Pronto,de novo a história da Praça!Será que não era mais bem empregue o dinheiro lá gasto,na melhoria de acessos à vila?Pergunta inocente.Sim,porque eu não sou "fofoqueiro".Quer dizer, se calhar,até sou.Pelo menos comecei logo por confessar esse pecado!
quinta-feira, 24 de junho de 2010
CRÓNICA-A DETESTÁVEL VUVUZELA
Se eu mandasse,o abominável canudo era destruído à porta dos estádios.De cá,porque estou mesmo a ver que a moda vai pegar e brevemente teremos o irritante zumbido a substituir os habituais cânticos clubisticos(de passagem,alguns também muito estúpidos)
Mas se fosse eu a mandar, não garanto que evitasse as tomadas de posição falhas de inteligência e bom senso.Se calhar,com o meu provincianismo bacoco,quem sabe se iria dar um passeio com a família, só para não estar presente na cerimónia fúnebre de alguém que, não sendo da minha particular simpatia,fosse considerada importante pelas pessoas cultas cá da terra.
Não sei porquê,lembrei-me agora de Saramago! E apercebi-me como a História é por vezes irónica!
O nosso pequenino País,além das sempre cantadas batalhas de outros tempos e o rasgar de rotas marítimas abrindo caminho para descoberta de novas terras,tem ainda aquilo que muitos países desejariam:dois(2)Prémios Nobel!
O primeiro foi atribuido ao Professor Egas Moniz,em 1949.Salazar,incompatibilizado com o agraciado,procurou sempre minimizar o feito.Nada a estranhar!
O segundo, deu ainda mais honra,por ser literário e foi atribuido a José Saramago,apesar do voto negativo de certo mesquinho político,responsável pela cultura do País(toda a gente sabe quem é Saramago,mas desconhece o insignificante Lara).
O mundo rendeu-se ao génio literário de Saramago,concordando ou não com as suas opções políticas.
No funeral do escritor,esteve o povo e várias individualidades portuguesas e estrangeiras.
Menos a figura que se impunha!
Ninguém esperava que em pleno século XXI um Chefe de Estado, ainda por cima democrata(?),recusasse estar presente nas exéquias de um vulto que orgulha o País.
Honra ao Presidente da Câmara de Lisboa,presente e participante na manifestação de homenagem.Cumprindo o determinado pela Presidência da República,mandou colocar a meia haste a bandeira nacional nos edifícios oficiais do município.Um "esquecimento" do seu congénere e "camarada" cá do burgo!
Sempre ouvi dizer:"As atitudes ficam com quem as pratica"
Felizmente atitudes como as que referi,são como"vozes de burro,não chegam ao céu"!
sexta-feira, 18 de junho de 2010
Rectificação obrigatória
Quando se descrevem as casas senhoriais da vila(concelho),refere-se o Palácio dos Costa Alemão.Em primeiro lugar,chamar palácio a um solar com aquelas caracteristicas,acho despropositado.E não ficaria melhor dizer"Casa da Família Costa Alemão"?Já à Quinta de S.Tomé,chama-se"casa solarenga",quando se trata de algo mais do que isso.Seria necessário estudar primeiro a história de Condeixa para falar sobre estes temas.E nesse caso era possível dizer Palácio dos Lemos Ramalho, em vez de Palácio dos Sotto Mayor.Mas não ficam por aqui os disparates.Diz o tal site:"as actuais instalações da Câmara também eram um Palácio",sem explicar qual. Que diabo, se até o próprio Município chama à sua casa Palácio dos Figueiredos da Guerra!(quanto a mim erradamente porque o palácio foi mandado construir pelo Conde de Portalegre.Os Figueiredos da Guerra foram seus proprietários, mas a pedra de armas que se encontra sobre o portão,é dos Cabrais).Quanto ao palácio dos Condes de Podentes, sempre foi o Hospício, desde o tempo em que era Convento de Frades Antoninos e não "actualmente conhecido como Hospício".A Pousada de Santa Cristina, nunca foi palácio e muito menos incendiado pelos franceses.Trata-se de um edifício construído de raiz para a função que desempenha.No seu local existiu sim o nobre Paço dos Almadas,propriedade do Conde de Avranches, D. Lourenço de Almada, pai de D. Antão Vaz de Almada, o aclamador de D.João IV.
Quando as tropas francesas de Massena e Ney,na retirada após a derrota nas Linhas de Torres,passaram por Condeixa,destruiram a vila, saqueando e incendiando muitas casas.Curiosamente, o Paço dos Almadas e o Palácio dos Lemos Ramalho escaparam inexplicávelmente à chacina.
Isto é história, baseada em factos reais e fácilmente comprováveis.Lamento profundamente nunca ter aparecido uma entidade oficial para "impor"o rigor histórico.Era o mínimo que se exigia!
Já agora, que tanto se fala(erradamente)nos prédios notáveis,podiam ser referidos:a Quinta da Lapa, o palácio dos Matos,no Sebal Grande, a Casa dos Sás,na Praça da República,a Quinta da Melhora e o Palácio dos Comendadores,na Ega, entre outros dignos de registo.
No final do texto "História" do já referido site, é dito:"actualmente Condeixa é uma vila relativamente desenvolvida,com indústria e comércio próprios.Além disso,beneficiando com a proximidade de Coimbra e Conímbriga".Desde quando Condeixa beneficiou com o facto de existir uma das mais importantes estações arqueológicas da península no seu concelho?
E vem finalmente a referência a personalidades ilustres!Apenas um nome:o do médico escritor Fernando Namora.
Então o Ministro da Rainha D.Maria II,Rodrigo da Fonseca Magalhães,que até foi o responsável pela recuperação do estatuto de Concelho?Lisboa prestou-lhe homenagem,dando o seu nome a uma das mais importantes artérias da capital.E o Padre Dr.João Antunes que embora sendo de Coimbra aqui se radicou e dedicou o saber e a fortuna às artes da vila,fundando uma Escola de Artes e Ofícios e o primeiro Orfeão de caracter popular do país?E Manuel Filipe,professor e artista plástico que doou o espólio à sua vila e agora tem galeria própria na velha Escola Conde de Ferreira?Por falar em artes plásticas,porque omitir teimosamente o nome de António Pimentel,autor do lindo painel de azulejos que adorna a parede do Salão Nobre da Câmara,artista reconhecido no mundo,com obras expostas em Museus e Galerias de Arte francesas,inglesas,brasileiras,etc.?E tantos outros ilustres condeixenses?
É ofensivo reduzir apenas a um nome,um tema que podia constituir verdadeiro rol!
domingo, 13 de junho de 2010
O Cine-Avenida de Condeixa
quinta-feira, 10 de junho de 2010
Contributo para conhecer Condeixa
Os estudiosos podem nesses locais procurar informação útil ao seu trabalho.Isso é História,baseada em criterioso trabalho de pesquisa documental,que personifica a estrutura cultural de um povo.
A vila possui uma única monografia,da autoria do Capitão Augusto dos Santos Conceição,ilustre figueirense que a Condeixa dedicou grande parte da sua vida,mas a quem Condeixa ainda não foi capaz de prestar a justa homenagem.
Em 1947,Santos Conceição editou um volume monográfico intitulado"Condeixa-a-Nova".Mais tarde,já após o falecimento deste historiador,José Maria Gaspar, Inspector Escolar e antigo Presidente da Câmara,lançou uma segunda edição da mesma monografia,com alterações cronológicas e de actualização.
Paralelamente à pesquisa histórica,relativamente importantes são os relatos alicerçados em exercícios de memória,quer dos autores dos mesmos,quer a partir do testemunho de pessoas que viveram factos dignos de registo.
Em 1953, uma parceria formada pelo livreiro e estudioso da história local, Isaac Pinto, e Fernando Rebelo,veterinário municipal e autarca, editou também um conjunto de cadernos intitulado"Subsídios para a história de Condeixa".
Curiosamente,o primeiro fascículo era dedicado ao teatro amador condeixense,desde 1814,data da primeira apresentação nesta vila que só em 1853 viria a alcançar o estatuto de sede do Concelho.É notável a escolha do tema,sinal expresso da intenção de dar relevo ao aspecto cultural dos referidos cadernos.
De posse destes dois trabalhos,pode o leitor atento compreender o percurso desta antiga povoação,hoje próspera vila de Condeixa.
Mas 1953 fica muito distante!Entretanto,muitos episódios relevantes sucederam,a vila naturalmente modificou-se,principalmente nas últimas décadas.Inclusivamente,até a própria Estrada Nacional deixou de passar bem no coração da terra e afastou-se,criando de certa forma a descentralização do burgo.
Exactamente pensando no hiato histórico do último meio século,tive a ideia de descrever a velha Condeixa do meu tempo ,relatando episódios e referindo figuras entretanto desaparecidas ou factos ainda na memória de alguns,poucos.Desta forma,os meus netos e os netos dos meus contemporâneos,terão base para contar aos seus próprios descendentes,como era a vila.
Vou começar as crónicas descrevendo a Praça.
O antigo Terreiro passou a designar-se Praça da República logo após a implantação desta e muito antes da demolição do Palácio dos Sás.Este imponente edifício do século XVII,foi incendiado pelas tropas francesas.
Em 1927 a Câmara adquiriu o semi destruído prédio,demoliu-o e alargou o Terreiro,abrindo também novas vias.
A Praça,simplesmente,como era designada,foi sempre o lugar mais importante da vila.Mesmo quando não passava de acanhado local,lá se realizava o mercado bissemanal,só extinto na década de 1980 e transferido para o Quintalão.
As grandes tílias mandadas plantar pelo Presidente Dr.Madeira Lopes em 1953,enquadravam magníficamente um vasto espaço que a "cama" do Rio do Cais,com a sua "cabeceira" de azulejos policromados, os jardins circulares e o agradável odor das árvores em flor,formavam um conjunto agradável para passeio nas amenas noites de verão.
A Praça era a sala de visitas de Condeixa.
Noutro tempo,em frente à residência do Professor Mateus(hoje Restaurante Madeira),havia um largo ao qual vinham dar duas ruas nascidas da foz da Avenida.Formavam um triângulo,pequena praceta que em 1947 foi aproveitada para a instalação de um Parque Infantil.Todo murado,tinha os apetrechos necessários à sua função e,facto curioso para a época,possuía uma pequena biblioteca.A pessoa encarregado do bom funcionamento do parque era a "menina Otília".Após longos anos de utilização,o progressivo processo de degradação levou a que o parque fosse desactivado.As alterações da arquitectura da Praça,acabaram inclusivamente com o local onde estava instalado.
Aos domingos a Praça assumia a sua verdadeira função de centro cívico da vila.
Pelos bancos sentavam-se famílias trocando entre si as últimas novidades e mexericos.Senhores circunspectos palmilhavam cadenciadamente a Praça de lés a lés,discutindo "assuntos de relevante interesse".E os miúdos corriam por entre todos,pontapeando a "bola" de trapos.De vez em quando,o achatado objecto colidia com as pernas dos presentes e lá vinha o chorrilho de imprecações.Então,se as canelas eram do velho Abel Batata,as pragas tinham conotação mais sinistra:"Antigamente ainda vinham umas febres que davam cabo desta canalhada toda!"
Também no atrás referido largo se jogava à bola,sempre com atenção à aparição da autoridade,avessa às brincadeiras das crianças.Quando não era a intromissão de certo zeloso funcionário camarário,inimigo figadal de futebol na via pública.
Um dia,jogava-se com uma bola de borracha,raríssimo luxo só alcançado quando algum "menino rico"se juntava à plebe.No momento em que o esférico saiu do controle dos improvisados futebolistas,surgiu da Rua Direita o "tal" camarário.Pegou na bola,retirou do bolso um canivete e,com requintes de malvadez,cortou-a em gomos,como se estivesse a descascar uma laranja,alheio aos protestos veementes da garotada que assim via terminar tão aguerrido desafio.
Bem no meio da Praça,ladeado por altos candeeiros de ferro fundido,erguia-se o Chafariz.Dizia-se que era a representação de um cesto de flores,referência ao brasão da vila.Ideia errada porque vários outros existiam exactamente iguais,como o de Castanheira de Pera, e cesto de flores,apenas o emblema da vila de Condeixa possui.
Actualmente o chafariz está localizado noutro local da Praça.Quando no sitio original,embora estorvando os jogos de bola,tinha a virtude de servir de local de convívio para a "malta",tão carente de sitio mais apropriado.
A abrir as portas da Avenida,existiam dois belos edifícios.Um deles foi demolido para dar lugar a um Banco,mas o outro continua como simbolo representativo da arquitectura da primeira metade do século XX.
Já a fechar a Praça,o corpo lateral da Igreja Matriz,dedicada a Santa Cristina,padroeira de Condeixa.
Esta era a Praça do meu tempo.Hoje está em processo de radical alteração.É uma página que se volta nesta Condeixa sempre em processo de descaracterização!
quinta-feira, 3 de junho de 2010
Alteração
domingo, 21 de fevereiro de 2010
Procissão do Senhor dos Passos em Condeixa
domingo, 17 de janeiro de 2010
O TEATRO EM CONDEIXA
sexta-feira, 15 de janeiro de 2010
terça-feira, 5 de janeiro de 2010
LUGARES DE CONDEIXA-A RUA PRINCIPAL
O prédio seguinte,era um estabelecimento de fazendas e pertencia a Manuel Alípio Coelho de Paula.(hoje é um restaurante).
Depois,a mercearia de David Salazar.No subterrâneo da sua casa existia uma gruta,a "cova funda",que ia quase até ao meio da Praça,paralelamente ao troço escondido do rio Caldeirão,exactamente ao encontro do local onde se situava a frontaria do prédio,posteriormente demolido,do Palácio dos Sás.Dizia-se que esse túnel servia,em tempos remotos,de escapatória aos proprietários do palácio,caso se tornasse necessário.
Logo a seguir,na esquina,a pequena papelaria da Sra.Marquinhas Pena,vulgarmente conhecida como "Marquinhas Bicha".Recordo-a como uma senhora de idade,baixinha e muito simpática,que vendia os cadernos e as lousas para os miúdos das escolas e falava com eles como se estivesse a tratar com adultos.No mesmo prédio,depois da esquina,a loja de sua filha,Soledade(Bicha).O estabelecimento tinha prateleiras onde se alinhavam urnas de pinho cru,sem qualquer ornamento.Curiosamente,apesar da estranha mercadoria,a loja não inspirava a natural aversão que motiva a presença dos artefactos macabros.
Depois,a papelaria de Isaac Pinto,com departamento de fotografia,esta última função da responsabilidade de seu filho José Pinto,fotógrafo artista,de quem ainda hoje podemos apreciar valiosos clichés que retratam o quotidiano condeixense do tempo.Isaac Pinto foi uma das mais importantes figuras culturais da vila,na primeira metade do século XX.Conhecedor profundo da vida social e cultural de Condeixa por nela participar activamente,foi,como ele um dia escreveu no jornal "A Pátria",co-fundador do Orfeon de Condeixa.Deixou para a posteridade grande número de escritos que documentam não só a época,mas factos antigos obtidos por persistente investigação.Muitos desses testemunhos,manuscritos,ficaram em mãos de familiares ou amigos e nunca foram editados.Felizmente,um dos mais importantes,um trabalho reunido em onze fascículos com o título genérico "Subsídios para a História de Condeixa",realizado em parceria com o veterinário municipal Dr.Fernando de Sá Viana Rebelo,foi editado pela Tipografia Ética,de Condeixa.Também a Igreja de Santa Cristina,na reconstrução que sofreu no princípio do século XX,beneficiou bastante com a sua sensibilidade artistica e profundo conhecimento da história daquele templo.Dos diversos artigos vendidos na papelaria:jornais,revistas e livros,contava-se uma publicação bissemanal de banda desenhada,"O Mosquito",bastante apetecida pelos garotos do meu tempo.Na falta de capacidade monetária para a adquirir e como o meu pai era assinante do jornal "O Século",em dia de saída do caderninho de bonecos,era eu que ia buscar o diário pois o Sr.Isaac deixava-me ler aquela edição infantil.No mesmo prédio,o Café Conímbriga,propriedade de José Pinto e Jaime dos Santos.Este café tinha nas paredes interiores belos frescos alusivos a alguns dos mais interessantes mosaicos de Conímbriga.
Com este estabelecimento,termina a Rua da Praça.
LARGO RODRIGO DA FONSECA MAGALHÃES
Começa o Largo,com a Igreja Matriz,dedicada a Santa Cristina,padroeira dos moleiros,profissão muito disseminada na vila.
Dizem os historiadores que em 1502 quando o Rei D.Manuel I passou a caminho de Santiago da Galiza,por achar a igreja muito pequena e em mau estado de conservação,mandou que novo templo se construísse.Disso encarregou os frades de Santa Cruz de Coimbra.Recorro à Monografia do Capitão Santos Conceição,que refere o livrinho do Cartório daquele Mosteiro,datado de 1521:"Contrato e obrigações que fizeram os moradores de Condeixa-a-Nova à fábrica do corpo da Igreja e altares dela;e o mosteiro se obrigou à fábrica da Capela Mor".Já em 1522,dizia o mesmo livro:"Obrigação que fizeram os moradores de Condeixa-a-Nova de darem toda a prata que for necessária para ornato e serviço da Igreja de Santa Cristina".
A nova Igreja deve ter sido acabada em 1543.Possui ampla nave e tinha o tecto abobadado,pintado com lindos frescos que,devido às sucessivas inflitrações da chuva, ficou bastante degradado e foi coberto com paineis de madeira,já na década de 1960.A Igreja,toda feita em pedra de Ançã lavrada,tinha os lambris das paredes interiores forrados com azulejos dourados.Havia nesta Igreja três capelas particulares,uma de D. Lourenço de Almada,senhor do Paço dos Almadas,outra de João de Sá Pereira,da Casa dos Sás e ainda outra dos Morgados de Morais Botelho,da Casa do Salgueiro.Hoje só a Casa dos Sás mantém a "sua" Capela.
O templo foi completamente destruído por incêndio durante as invasões francesas e muito mal restaurado no século XIX,quando inclusivamente entaiparam algumas capelas.No início do século XX foi remodelada com grande rigor,graças à sensibilidade artística e intelectual de Isaac Pinto e do Padre Dr.João Antunes.
Em frente à Igreja,um edifício que foi propriedade de João Pimentel das Neves,personalidade de grande importância no percurso cultural da vila.Foi encenador de vários grupos de teatro amador e ocupou ainda por diversas vezes o cargo de presidente do Clube de Condeixa.Em 27 de Abril de 1974,chefiou a Comissão Administrativa da Câmara Municipal,conjuntamente com António Caniceiro da Costa e Fortunato Pires da Rocha.
O prédio ao lado pertencia a José Dias Ferreira e,como já tive oportunidade de referir,foi ali que nasceu Rodrigo da Fonseca Magalhães.No rés-do-chão está instalado o mais antigo estabelecimento de Condeixa,sempre do mesmo ramo,uma centenária loja de ferragens.
No espaço entre o corpo da Igreja e os actuais Paços do Concelho,existiu também outra loja de ferragens que pertencia à família Pires Machado,mas era conhecida como "a loja do Sr.Franklim".
O largo que se inicia após este estabelecimento era um dos locais utilizados pelo mercado bissemanal e por isso conhecido como Feira das Galinhas.O seu nome verdadeiro é:
LARGO ARTUR BARRETO
O edifício dos actuais Paços do Concelho domina todo o local.Datado da primeira metade do século XVII,pertenceu aos Condes de Portalegre e também foi conhecido como Palácio do Capitão-Mor.Para a posteridade ficou no entanto o nome de família de um dos proprietários,Figueiredo da Guerra,embora a pedra de armas que ostenta sobre o portão seja dos Cabrais,também seus antigos donos .
Numa visita que fiz às ruínas da Quinta de S.Tomé,vi embutidos na parede interior da capela dois brasões dos Figueiredos da Guerra,sendo um deles presumivelmente o que esteve na frontaria do palácio do Largo Artur Barreto.Tem forma rectangular e é ladeado por duas volutas,uma invertida da outra.Lavrado em pedra calcária(Ançã?),está decorado com artistico entrelaçado de folhas de acanto gótico em relevo.No centro tem um escudo no qual estão cinco folhas de figueira,duas em cima,duas em baixo e uma ao centro.De cada lado desta,as letras A e I.A encimar o escudo,um elmo com leão coroado .Por cima desta pedra,estava um escudo mais pequeno,em tudo semelhante ao anteriormente descrito,mas sem leão sobre o elmo.Dado o estado de ruína da referida capela e temendo a derrocada iminente com a consequente destruição das pedras de armas,em 2005 pedi ao Presidente da Câmara,Eng,Jorge Bento que as mandasse retirar.Ele mais tarde informou-me tê-lo feito e ordenado que fossem recolhidas no estaleiro(?),junto ao cemitério!
Na terceira invasão francesa,as tropas de Massena e Ney,além de muitos outros edifícios da vila,também vandalizaram e incendiaram o palácio dos Figueiredos da Guerra.Em 1857 foi vendido a Albino Justiniano de Carvalho,que o mandou reconstruir respeitando a primitiva arquitectura.Porém os belos azulejos do século XVII representando motivos de caça e que decoravam as escadas e varanda do pátio interior,não foram recuperados.O velho edifício foi posteriormente herdado por Artur da Conceição Barreto que o doou,juntamente com alguns prédios confinantes,à Fundação Hospital D.Ana Laboreiro d'Eça.Já no século XX estiveram lá instalados vários serviços.No 1º andar,o Tribunal Judicial e a sede do Clube de Condeixa.No rés-do-chão,um armazém de mercearias,um estaleiro de materiais de construção e uma oficina de marcenaria.Entretanto a Câmara adquiriu o imóvel.Depois de profundas obras de reconstrução e remodelação,transformou o vetusto edifício em Paços do Concelho,um destino que dignificou os serviços ali instalados e preservou o património arquitectónico da vila.
A velha Feira das Galinhas é hoje um agradável jardim que colocou em maior destaque o Monumento aos Mortos da 1ªGrande Guerra,o primeiro a ser erigido no nosso país,exactamente em 9 de Março de 1921.Quando o largo era um simples terreiro,ali se realizavam espectáculos ao ar livre com companhias de saltimbancos,grupos de acrobatas que percorriam o país de lés a lés,actuando nas pequenas localidades.
Em frente à Câmara,o prédio que tem a placa com o nome do largo,foi desenhado pelo conceituado arquitecto Raul Lino,autor de vários projectos como a"Casa dos Patudos",em Alpiarça e o palacete do Dr.Ângelo da Fonseca,onde está instalado o Governo Civil de Coimbra.
Paredes meias,era a loja de solas e cabedais de José Lopes Cardoso que no Canto,por detrás do prédio do estabelecimento,montou uma pequena industria de manufactura de calçado.A sapataria tinha uma curiosa forma de comercializar a sua mercadoria.Os clientes adquiriam uma caderneta onde era afixada a quantia periódica paga e constituía no final,a importância do valor comprado.A cada caderneta era atribuído um número.Semanalmente,se esse número correspondia aos últimos algarismos do primeiro prémio da lotaria nacional,o dono da caderneta era brindado com a oferta do calçado sem precisar de continuar a pagar prestações.
Depois de um breve passeio que marcava a antiga cota do largo, existiu um alto patamar com escada.Quando se fez o rebaixamento da rua que segue para a Faia,as casas já existentes ficaram numa cota superior.Daí a necessidade de construir patamares para seus acessos.
A terminar o Largo Artur Barreto,a casa onde nasceu o médico e romancista Dr.Fernando Namora que legou todo o seu espólio literário e pictórico a Condeixa.Hoje o prédio é a Casa Museu Fernando Namora.
RUA D.ELSA FRANCO SOTTO MAYOR
Começava a rua com o armazém de vinhos da firma Moita & Companhia,um longo barracão de parede e telhado,com tonéis e vazilhas do alcoólico líquido.Esta rua,no meu tempo,pouco tinha a assinalar.A actual Rua Fernando Namora,(que ia dar aos terrenos do Paraíso,ao fundo da fonte do Outeiro,um local várias vezes utilizado para instalações de circos e barracas de diversão ou,por vezes,barracas de teatro itinerante), tem mesmo à esquina,um prédio que,quando andava em construção originou um episódio engraçado.A futura inquilina foi ver como decorriam as obras.Ao passar junto à inacabada casa-de-banho,disse ao dono da obra:"Então e o bidé?Não se equeça de mandar colocar o bidé!".O homem que nunca tinha ouvido falar em tal coisa,calou-se.Durante o decorrer da visita,a senhora falou várias vezes no acessório e quando ia a despedir-se,ainda recomendou:"Não se esqueça do bidé!"Aí ele passou-se!Desconhecendo em absoluto para que servia tal coisa,perguntou desabridamente:"P'ra que raio quer a senhora o bidé?"A casa ficou,após isto,conhecida como "a casa do bidé".
Quase ao fim da rua existia a Fonte da Caraça,designação para mim incompreensível pois nada lá havia que justificasse o nome.Localizava-se numa cota bastante inferior à rua e o acesso fazia-se através de escada de longos degraus.A fonte,própriamente dita,era bonita,toda em azulejos policromados,mas o local estava sempre conspurcado.As pessoas lançavam de cima toda a qualidade de lixo e,como era habitual naquele tempo,por falta de instalações sanitárias,muita gente aproveitava o facto de ser um sítio recatado e utilizavam-no como retrete pública.Aliás,não era apenas a Fonte da Caraça que servia de sentina.O Penedo,local ermo e sem iluminação,era por excelência o sítio mais apetecido.
Quando construíram as instalações da Casa do Povo,a fonte foi tapada.Mas nessa altura retiraram de lá os bonitos azulejos que hoje estarão a decorar algum jardim particular.
Um pouco mais abaixo,junto ao actual acesso ao Quartel da GNR,era a Auto-Mecânica de Condeixa,um estabelecimento polivalente com estação de serviço,lavagem de viaturas,venda e mudança de pneus,oficina de automóveis,secção de pintura e bombas de abastecimento de combustíveis.Edificada no início da década de 1950,era bastante moderna para a época.
Mais além,aquela que deu nome popular à rua,a Faia,uma frondosa árvore bem no entroncamento de três vias importantes,a Estrada Nacional nº1,a estrada para Soure e a estrada para Alfarelos.
O nome derivava do facto de ali ter existido uma grande árvore desta espécie.No entanto,aquela que chegou aos nossos dias,mesmo centenária,não era faia.Podemos talvez situá-la na família dos plátanos.A Faia,apesar de ser considerada árvore de interesse público por decreto de 6 de Fevereiro de 1942,foi abatida por motivo das obras que se operaram com a abertura da estrada para Tomar.
Para finalizar a descrição da Rua Pricipal,resta falar no Faia-Bar,mais conhecido por Café do Arranhado.Era propriedade de Joaquim Pocinho(Quim Arranhado).O pai,Joaquim Duarte Pocinho,era um excelente serralheiro de ferro forjado e esteve longos anos emigrado na Venezuela.
Terminou esta viagem no tempo pela Rua Principal.Porque se trata da maior artéria da vila,tive alguma dificuldade em retirar da memória factos e pessoas duma época já tão distante.Quando refiro factos históricos,baseio-me em informação que devidamente referi.Porém essa fonte é a mais fácil de obter,porque está ao dispor de quem a queira procurar.A outra,a estória de pessoas e factos ocorridos com elas é,no fundo,a que mais me incentivou a escrever estas crónicas.Porque afinal,a memória de um local está na vivência dos seus habitantes,num determinado momento da vida.Evidentemente,muitas coisas ficaram por contar.Das referidas,uma ou outra será susceptível de contestação.Naturalmente,terei de assumir a respectiva responsabilidade e as criticas adjacentes.
Condeixa,ano de 2007 Cândido Pereira